A comédia do déficit no "Bananil" – Por Paula Sousa

Acabo de ter uma epifania, digna dos melhores roteiros de comédia, mas com um toque de terror financeiro. Sabe o Malvo, o assaltante da série "Todo Mundo Odeia o Chris"? Aquele que diz que é "dureza assaltar uma loja de armas, tem armas lá"? Pois é, o nosso governo, em sua infinita e hilária sabedoria fiscal, parece ter adotado essa filosofia como manual de conduta.
Aqui no "Bananil" – onde a impunidade dos criminosos comuns só perde em audácia para a impunidade dos "criminosos do colarinho azul-vermelho-e-todas-as-cores-do-arco-íris" –, não basta sermos ameaçados na rua. Não, senhor! Temos que lidar com o "bandido do bairro" em nível federal.
E por que estou eu divagando sobre a geopolítica de Bed-Stuy e a realidade brasileira? Porque li uma notícia que me fez rir mais do que a série: "Brasil terá déficit fiscal em 2025 apesar de arrecadação histórica".
É a piada pronta, gente! Arrecadamos mais de 3 trilhões, e o ano nem acabou. É dinheiro que não acaba mais, saindo do nosso bolso, pingando em cada esquina, em cada nota fiscal. Mas, como um trabalhador que ganha um aumento no salário mínimo e, magicamente, está ainda mais endividado, as despesas públicas crescem num ritmo de 100 bilhões por mês! Sim, o governo está gastando mais rápido do que esposa com um cartão de crédito sem limite em liquidação de sapatos.
O economista Ulisses Ruiz de Gamboa já soltou o óbvio: "O gasto está crescendo muito além da capacidade de arrecadação. O resultado disso é o aumento do endividamento." Ah, vá! Jura? Descobriu o Brasil! É como dizer que água molha. Mas o engraçado é que, apesar de toda essa festa de gastos, as empresas estatais, essas joias da coroa do governo, acumularam um déficit primário de 18,5 bilhões desde o início do terceiro mandato de Lula. Os Correios, por exemplo, registraram um rombo de 4,3 bilhões em apenas seis meses de 2025. É muita carta fora do baralho!
Para tentar nos acalmar, o governo faz o famoso "contingenciamento" de 31,3 bilhões, elevando o corte. Isso é a versão orçamentária da esposa que promete ao marido, com uma mão no coração e com a outra cruzando os dedos, de que não vai mais comprar roupas e sapatos, mas já está pensando na próxima promoção da SHEIN. É um "déficit zero" na teoria, mas na prática, o Tribunal de Contas da União (TCU) já apontou "irregularidades na conduta do governo ao utilizar o limite inferior da meta fiscal." Clássico!
Eis onde o Malvo entra de novo, e a inversão de valores se torna cristalina.
Quando o governo se propõe a arrecadar, ele se comporta como um seletivo colecionador de impostos. Ele quer o dinheiro que vem das "fontes decentes" – ou seja, do seu suor e do meu -, mas dá um uma trégua, uma paz de espírito ao narco-estado.
Pensemos nas Bets (apostas online). Um câncer social, quebra famílias, mas rende um bom dindim. O governo, generosamente, reduz a taxação de 17% para 12%. Por quê? Ora, não podemos incomodar demais essa fonte de "entretenimento", não é? Melhor tributar a Dona Maria que vende bolo de pote na porta do metrô.
E a hipocrisia continua:
- Bebidas Quentes: Tínhamos um instituto para controle, mas era "caro" (3 bilhões). Agora, o metanol mata em São Paulo, e a bebida, controlada pelo narco-estado, chega em qualquer mesa. O controle custava 3 bilhões. E quanto custa essa renúncia de arrecadação potencial com o controle de bebidas aquecidas? Mais de 50 bilhões!
- Cigarros Aquecidos e Vapes: Malefícios à saúde? Claro! Mas o mercado clandestino fatura quase 10 bilhões. A ANVISA não libera a regulamentação, e o narco-tráfico vende a rodo. Por que não regulamentar, tributar (como o cigarro comum) e controlar? Porque, veja bem, isso incomodaria os fornecedores.
- Devedor Contumaz: O cara do posto de gasolina que frauda, que sonega 100 bilhões e ninguém pode fiscalizar direito, porque a Receita não pode fornecer as notas para a agência estadual. Sigilo? Sigilo para quem? Para o sonegador!
O governo está renunciando a uma arrecadação potencial de mais de 100 bilhões nessas áreas – todas elas ligadas ou infiltradas pelo crime organizado ou por sonegadores de carteirinha.
E por que renunciar a 100 bilhões que estão na mão do crime e da contravenção, mas apertar o parafuso do cidadão honesto?
A resposta é simples, e o Malvo já deu a pista: É dureza cobrar do crime organizado. Eles têm armas.
É mais fácil e seguro, para o governo, continuar drenando o dinheiro do seu imposto de renda, do seu consumo, do seu esforço. Deixar a fonte de receita do crime organizada em paz, para que eles continuem "trabalhando" e mantendo a "recuperação estrutural" (leia-se: o buraco) de nosso país.
Enquanto o ministro da Fazenda garante que o déficit será "o menor no quadriênio" (o que é como dizer que vou começar a dieta na segunda-feira), a gente ri. Ri de nervoso, porque o Malvo não está mais só assaltando o mercadinho do Chris. Ele está sentado na cadeira do planejamento, com a arma de mentira na mão, nos ensinando a mais valiosa lição da política fiscal brasileira: por que se estressar com quem tem armas, quando se pode espremer quem só tem boleto?
É, de fato, a maior comédia de todos os tempos. E o custo do ingresso, infelizmente, somos nós que pagamos. (Paula Sousa é historiadora, professora e articulista; 20/10/2025)

