05/12/2025

A sombra do crime organizado na política – Editorial Folha de S.Paulo

A sombra do crime organizado na política – Editorial Folha de S.Paulo

Agentes da Receita Federal e da Polícia Militar cumprem mandados da operação Carbono Oculto, em São Paulo (SP) - DivulgaçãoReceita Federal

 

  • Risco de interferência de facções nas eleições exige inteligência financeira e fiscalização de campanhas
  • Se o crime organizado se infiltra na econômica e no Estado, pode influenciar pleitos, moldar decisões e capturar políticas públicasRelatório recém-divulgado pela Agência Brasileira de Inteligência (Abin) alerta para o risco de atuação de organizações criminosas nas eleições de 2026.
  •  

A interferência desses grupos na política e na gestão pública se dá como extensão da diversificação dos negócios ilícitos —que não se restringem mais ao tráfico de drogas— na economia formal, seja com a comercialização de produtos adulterados ou contrabandeados, lavagem de dinheiro, aplicações financeiras e participação em contratos públicos.

 

Operações recentes da Polícia Federal, como Fim da Linha, Carbono Oculto, Poço de Lobato e Compliance Zero, revelaram a engenharia criminosa que sustenta essa influência nefasta.

 

Controle de concessões de transporte, lavagem por ditas fintechs, fraudes tributárias e fragilidades do sistema financeiro constituem um cenário de imbricação de dinheiro lícito e ilícito no qual a política pode ser capturada por meio de recursos destinados a partidos e campanhas.

 

Os riscos envolvem candidaturas de fachada, investidores fictícios, ausência de controle padronizado da origem de verbas e patrocínios, lacunas na regulação de gastos e estruturas de fiscalização insuficientes para o volume e a complexidade das operações que ocorrem em eleições.

 

Se o crime organizado se infiltra na atividade econômica e no Estado, amplifica sua capacidade não só de influenciar resultados de pleitos, mas de moldar decisões e capturar políticas públicas.

 

A Operação Zargun, deflagrada em setembro, oferece um recorte dessa cooptação. A investigação de um esquema de corrupção entre lideranças da facção Comando Vermelho e diversos agentes públicos no Rio de Janeiro, ainda em andamento, levou às prisões do deputado estadual TH Joias (MDB) e de ninguém menos que o presidente da Assembleia Legislativa fluminense, Rodrigo Bacellar (União Brasil).

 

A resposta exige coordenação institucional e adesão a boas práticas já recomendadas por organismos internacionais, como ONUOCDE e Grupo de Ação Financeira Internacional (GAFI).

 

Entre elas, reforço da inteligência financeira, rastreamento aprofundado do beneficiário final de empresas e doadores, auditorias contínuas de campanhas eleitorais, transparência de contratos públicos em tempo real e responsabilização efetiva pela Justiça de candidatos e partidos apoiados por recursos ilícitos.

 

Um esforço integrado na mitigação de riscos é imperativo para preservar a integridade das eleições —e, em última instância, a confiança na democracia (Folha, 5/12/25)