Faesp: “Tese” para expulsão de líder oposicionista tomba com decisão do MP

O promotor de Justiça Reinaldo Lucas de Melo, em manifestação feita no último dia 25 de março (Leia a íntegra abaixo), considerou que o recurso impetrado no Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo por Fábio de Salles Meirelles e Tirso Meirelles contra Paulo Junqueira “não merece provimento”.

Sucessivas derrotas na Justiça abalam a “Capitania Hereditária no Agronegócio” que parece estar chegando ao fim com Fábio de Salles Meirelles, há quase meio século no comando da Federação da Agricultura do Estado de São Paulo – Faesp/Senar que tenta impor como seu sucessor o filho Tirso Meirelles. Foto Reprodução Blog EstiloAP
O recurso foi apresentado após decisão do juiz Lúcio Alberto Eneas da Silva Ferreira, da 4ª Vara Criminal de Ribeirão Preto, que em 24 de janeiro rejeitou a queixa-crime ajuizada pelos Meirelle’s – pai e filho – contra Paulo Junqueira, advogado e produtor rural, presidente do Sindicato e da Associação Rural de Ribeirão Preto e da Assovale – Associação Rural do Vale do Rio Pardo. Ele também é o coordenador do movimento de oposição “Nova Faesp”.
Como se recorda, a queixa-crime buscava a condenação de Paulo Junqueira por difamação e injúria em comentários feitos pelas redes sociais. A rejeição, por ausência de “justa causa para a ação penal”, pegou de surpresa Fábio Meirelles, que durante quase meio século presidiu a Federação da Agricultura do Estado de São Paulo – Faesp/Senar e que tenta impor em seu lugar o filho, Tirso Meirelles.
A “eleição” realizada em dezembro de 2023, que legitimaria a sucessão familiar no comando da federação, acabou sendo anulada por fraude e irregularidades pela Justiça do Trabalho em decisões de 1ª e 2ª instâncias e o processo agora encontra-se no Tribunal Superior do Trabalho, em Brasília. Em 14 de abril do ano passado, Tirso Meirelles presidente sub judice, tentou tomar auto posse em cerimônia glamorosa no Theatro Municipal de São Paulo mas foi impedido pelo Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região.
Tirso Meirelles mantém-se no cargo sub judice através de recursos suspensivos. Fonte da presidência da Faesp/Senar confirma que a “queixa-crime” era a principal estratégia para embasar o início do processo administrativo disciplinar com o objetivo de “deliberar sobre a exclusão de Paulo Junqueira. O primeiro passo, com este objetivo, foi a criação em 16 de janeiro de 2024 da “Comissão de Sindicância Interna”, formada pela advogada do Senar/SP Juliana Canaan, do assessor da presidência da Faesp Saimon Rosa e do advogado da Faesp Thiago Soares.
Uso do gabinete e mesmo e-mail da presidência para arregimentar apoios

Saimon Rosa, assessor do presidente sub judice da Federação da Agricultura do Estado de São Paulo – Faesp/Senar, usou a estrutura da entidade para arregimentar apoios para defenestrar Paulo Junqueira, coordenador da chapa de oposição “Nova Faesp”. O anúncio de que tenha conseguido assinaturas de 57 dos 230 presidentes de sindicatos rurais paulistas é falso, pois em sua relação há pelo menos uma assinatura duplicada e há dúvidas se os signatários do documento são, efetiva e legalmente, produtores rurais. Foto Linkedin- Saimon Rosa - Reprodução
A mesma fonte revela que o presidente sub judice Tirso Meirelles escalou Saimon Rosa para buscar o apoio de dirigentes de sindicatos rurais. Usando o gabinete da presidência, o assessor expediu a mensagem abaixo aos dirigentes dos sindicatos rurais paulistas:
“Bom dia, tudo bem? Precisamos da sua ajuda
Por favor, isso é extremamente confidencial, não passe para ninguém
Precisamos tomar providências quanto ao Presidente do Sindicato Rural de Ribeirão Preto, por isso preciso que faça um ofício para o Presidente da FAESP com a mesma idéia do texto abaixo e encaminhe no email:
presidencia@faespsenar.com.br com cópia para saimono@faespsenar.com.br
Senhor Presidente
Servimo-nos do presente para, na qualidade de Presidente do Sindicato Rural de ... , para verificar com Vossa Senhoria, quais foram as providências tomadas com relação ao Presidente do Sindicato Rural de Ribeirão Preto, Senhor Paulo Junqueira, que por diversas vezes denegriu à classe rural bem como os Presidentes dos Sindicatos Rurais, ao dizer que recebíamos “jabazinho” para participar da eleição da FAESP bem como diversos outros vídeos denegrindo a imagem da FAESP e dos Sindicatos Rurais.
Entendemos que foram anos de trabalho para fortalecer o Sindicato Rural e não ser justo que uma pessoa sem responsabilidade venha manchar toda a imagem de um trabalho.
Solicitamos imediatas providências diante de tantas irresponsabilidades. Atenciosamente”
Samuel Rosa conseguiu 57 “apoios”, dos 237 sindicatos rurais do Estado de São Paulo. Mas há dúvidas que os subscritores do documento forjado pela presidência da Faesp/Senar sejam de fato e de direito produtores rurais e não há nenhuma explicação ou justificativa para assinaturas repetidas no documento.
Os “estrategistas” da Faesp/Senar não contavam que a queixa-crime contra Paulo Junqueira seria rejeitada e que a artimanha engendrada pelo presidente sub judice Tirso Meirelles, liberando seu gabinete e mesmo seu e-mail oficial, além de designar funcionário da entidade para arregimentar “apoios”, se tornassem publicamente conhecidos (Da Redação, 31/3/25)

4ª VARA CRIMINAL DA COMARCA DE RIBEIRÃO PRETO
AUTOS N° 1048881-88.2024.8.26.0506
RECORRENTES: TIRSO DE SALLES MEIRELLES E FÁBIO DE SALLES MEIRELLES
RECORRIDO: PAULO MAXIMIANO JUNQUEIRA NETO
PARECER DO MINISTÉRIO PÚBLICO
Egrégio Tribunal de Justiça
Colenda Câmara
Douta Procuradoria de Justiça
TRATA-SE DE RECURSO EM SENTIDO ESTRITO INTERPOSTO (FLS.153/154 E 178/218) CONTRAA R. DECISÃO DE FLS.138/144 QUE REJEITOU A QUEIXA-CRIME ANTE FALTA DE JUSTA CAUSA PARA A DEFLAGRAÇÃO DA AÇÃOPENAL PELA SUPOSTA PRÁTICA DO DELITO PREVISTO NO ARTIGO 139 C.C. ARTIGO 141, § 2º DO CÓDIGO PENAL.
OS RECORRENTES, EM SÍNTESE, REAFIRMARAM A PRESENÇA DA JUSTA CAUSA E DOLO ESPECÍFICO DO QUERELADO/RECORRIDO NOS DIZERES PROFERIDOS, RESTANDO, A SEU VER, PLENAMENTE CARACTERIZADO O CRIME DE DIFAMAÇÃO.
O QUERELADO/RECORRIDO APRESENTOU CONTRARRAZÕES (FLS.225/244).
É O RELATÓRIO.
O RECURSO DEVE SER CONHECIDO, EIS QUE TEMPESTIVO E ADEQUADO.
NO MÉRITO, CONTUDO, NÃO MERECE PROVIMENTO.
CONVÉM RECORDAR QUE OS RECORRENTES IMPUTARAM AO RECORRIDO O DELITO DE DIFAMAÇÃO, POIS DURANTE UM VÍDEO VEICULADO ESTE TERIA SE REFERIDO ÀQUELES COMO “REI E PRÍNCIPE”, BEM COMO DITO QUE NÃO HAVERIA PAGAMENTO DE “JABÁ” PELOS RECORRENTES. O CONTEXTO DOS DIZERES FOI O SEGUINTE:
“O segundo ponto seria sobre uma posse que vai haver no Teatro Municipal de São Paulo. Não se esqueçam, a eleição ainda está sub judice, então eu gostaria de alertar, não só as autoridades, como todos aqueles que eventualmente vão participar, por óbvio, convidados apenas dos sindicatos que são amigos lá do REI e do PRÍNCIPE, Sindicato Rural de Ribeirão Preto ficou sabendo por interpostas pessoas que a sala do Teatro Municipal seria utilizada no dia 14 de abril para essa posse. Não sei quem é que está custeando, quem é que está pagando isso, pode ser que seja do bolso do TIRSO. Mas agora a gente já teve informação que não vai haver o pagamento de hotel e parece também que aquele JABÁ, aquela diária para cada um dos sindicatos, não sei também se isso vai ocorrer para que haja a presença destes sindicatos convidados” (FLS.08/09).
INICIALMENTE É PRECISO PONTUAR QUE OS ENVOLVIDOS FIGURAVAM EM POLOS OPOSTOS NA DISPUTA ELEITORAL DA PRESIDÊNCIA DA FEDERAÇÃO DE AGRICULTURA E PECUÁRIA DO ESTADO DE SÃO PAULO (FAESP), INSTITUIÇÃO REPRESENTATIVA DE SINDICATOS RURAIS, SENDO QUE À ÉPOCA O CARGO DA PRESIDÊNCIA, ENTÃO OCUPADO PELO RECORRIDO, ERA DISPUTADO POR ELE E OS RECORRENTES.
CONFORME JÁ MENCIONADO NO PARECER MINISTERIAL DE FLS.97/102, FICA EVIDENCIADO QUE OS ENVOLVIDOS PERTENCIAM A CHAPAS ANTAGÔNICAS DA DISPUTA ELEITORAL PARA O CARGO DIRETIVO DAQUELE ÓRGÃO DE CLASSE, SENDO CERTA E ESPERADA A ANIMOSIDADE ENTRE ELES.
QUER-SE DIZER COM ISSO QUE NO PALCO POLÍTICO, EM VERDADEIRO CONTEXTO DE DISPUTA E CONFLITO DE IDEIAS/PROPOSTAS, HÁ QUE SE CONTEXTUALIZAR OS DIZERES DOS ENVOLVIDOS, COMUMENTE CARREGADOS DE CRÍTICAS INTENSAS, ‘FRASES DE EFEITO’, OPOSIÇÕES E DESCONTENTAMENTO.
NESSE SENTIDO, HELENO CLÁUDIO FRAGOSO ENSINA: “o propósito de ofender integra o conteúdo de fato dos crimes contra a honra. Trata-se do chamado 'dolo específico', que é elemento subjetivo do tipo inerente à ação de ofender. Em consequência, não se configura o crime se a expressão ofensiva for realizada sem o propósito de ofender. É o caso, por exemplo, da manifestação eventualmente ofensiva feita com o propósito de informar ou narrar um acontecimento (animus narrandi), ou com o propósito de debater ou criticar (animus criticandi), particularmente amplo em matéria política." (LIÇÕES DE DIREITO PENAL PARTEESPECIAL; 10ª ED., RIO DE JANEIRO: FORENSE, 1988, P. 221-222, V.I.).
ANALISANDO-SE OS DIZERES DO RECORRIDO, AINDA QUE SE RECONHEÇA A UTILIZAÇÃO DE UM TOM JOCOSO OU IRÔNICO AO SE REFERIR AOS RECORRENTES COMO “REI E PRÍNCIPE”, CONCLUI-SE SER INVIÁVEL A PRESUNÇÃO DO DOLO ESPECÍFICO – IMPRESCINDÍVEL PARA A CARACTERIZAÇÃO DOS DELITOS CONTRA A HONRA -, MAS TÃO SOMENTE O TEOR INFORMATIVO, NARRATIVO (animus narrandi) E CRÍTICO DE SUAS FALAS.
ALIÁS, É REMANSOSA A JURISPRUDÊNCIA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA SOBRE O PENAL E PROCESSUAL PENAL. CRIMES CONTRA A HONRA. MEMBROS DO MINISTÉRIO PÚBLICO. 1. Ao examinar-se a tipicidade dos delitos de difamação e injúria, é importante examinar o tempo e lugar de ocorrência dos fatos e as peculiaridades da situação de cada denunciado. 2. No teatro de disputas políticas e de espaço de poder institucional, as condutas dos envolvidos nos fatos desencadeadores da denúncia criminal tornam desculpáveis possíveis ofensas, acusações e adjetivações indesejáveis. 3. Na avaliação contextual dos fatos pertinentes, não se identifica a vontade deliberada de difamar ou injuriar. 4. As ásperas palavras dirigidas à vítima, pela denunciada, soam como indignação pelos episódios institucionais vivenciados. 5. O crime de calúnia exige imputação de crime praticado pela vítima, por fato ou fatos determinados, o que inocorreu na espécie. 6. Denúncia rejeitada. (APn n. 516/DF, relatora Ministra Eliana Calmon, Corte Especial, julgado em 20/8/2008, DJe de 6/10/2008.)
“O animus narrandi depreendido do voto faz ressoar inequívoco que o voto tão somente teve o condão de narrar os acontecimentos, quando muito com dose de animus criticandi sem que se pudesse depreender qualquer intenção de injuriar a procuradora representante. Sob esse ângulo, narrou o expositor do voto. (APn n. 555/DF, relator Ministro Luiz Fux, Corte Especial, julgado em 1/4/2009, DJe de 14/5/2009.)
DA MESMA FORMA, A UTILIZAÇÃO DO TERMO “JABÁ” NÃO PODE SER CONSIDERADAOFENSIVA À HONRA DOS RECORRENTES, SOBRETUDO NO CONTEXTO UTILIZADO – DE QUE “NÃO HAVERIA PAGAMENTODEJABÁ”. OU SEJA, ATÉ EM SENTIDO DE NEGATIVO - DE NÃO EXISTIR.
DESSA FORMA, CONCLUI-SE QUE A FALA DO RECORRIDO TEM RESPALDADO NO DIREITO CONSTITUCIONAL DE LIBERDADE DE EXPRESSÃO, COM O INCONTROVERSO E EVIDENTE OBJETIVO DE TÃO SOMENTE EXPRESSAR SUA OPINIÃO SOBRE ACONTECIMENTOS LIGADOS AO PROCESSO ELEITORAL SINDICAL, CIRCUNSTÂNCIA ESTA QUE DESCARACTERIZA O DOLO ESPECÍFICO E, CONSEQUENTEMENTE, A PRÓPRIA TIPICIDADE DEEVENTUAL CRIME CONTRA A HONRA.
COMO BEM MENCIONADO NA QUEIXA-CRIME (FLS.07), “as disputas sempre existirão”. E, CERTAMENTE, CRÍTICAS TAMBÉM.
FINALMENTE, VALE REPISAR QUE, EM REVERÊNCIA AO POSTULADO DA INTERVENÇÃO MÍNIMA, O PRESENTE RAMO DO DIREITO DEVE SE MANTER SUBSIDIÁRIO E FRAGMENTÁRIO, INCIDINDO APENAS NAS HIPÓTESES EM QUE SE REVELAR TOTALMENTE CRUCIAL A SUA APLICAÇÃO, ISTO É, QUANDO AS OUTRAS ESFERAS COMO A ADMINISTRATIVAE CÍVEL, SE REVELAREM IMPOTENTES PARA A SOLUÇÃO DOS CONFLITOS SOCIAIS, TRATANDO-SE DE ultima ratio, DERRADEIRA ETAPA PARA A EFETIVA GARANTIA DE PROTEÇÃO DOS BENS JURÍDICOS CLASSIFICADOS COMO OS MAIS IMPORTANTES PARA A MANUTENÇÃO E O DESENVOLVIMENTO DA SOCIEDADE E DOS INDIVÍDUOS QUE A COMPÕEM, DE TAL SORTE A LIMITAR O PODERPUNITIVO ESTATAL.
A PROPÓSITO, CONFIRA-SE:
“A EXISTÊNCIA DE UM ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO PASSA, NECESSARIAMENTE, POR UMA BUSCA CONSTANTE DE UM DIREITO PENAL MÍNIMO, FRAGMENTÁRIO, SUBSIDIÁRIO, CAPAZ DE INTERVIR APENAS E TÃO SOMENTE NAQUELAS SITUAÇÕES EM QUE OUTROS RAMOS DO DIREITO NÃOFORAM APTOS A PROPICIAR A PACIFICAÇÃO SOCIAL.” (STF, HC 107638/PE, Primeira Turma, Ministra Cármen Lúcia, julgado em 13/09/2011).
DESTARTE, AO NOSSO VER NÃO MERECE CENSURA A R. SENTENÇA.
DIANTE DO EXPOSTO, O MINISTÉRIO PÚBLICO AGUARDA SEJA NEGADO PROVIMENTO AO PRESENTE RECURSO, POIS AGINDO ASSIM VOSSAS EXCELÊNCIAS FARÃO A COSTUMEIRA JUSTIÇA.
Ribeirão Preto, 25 de março de 2025.
Reinaldo Lucas de Melo Promotor(a) de Justiça.

