Flávio no jogo e o voto nulo que não deve se repetir – Por Paula Sousa
Foto Reprodução Blog Imediato/Divulgação
O cenário político de 2026 está se desenhando com uma intensidade que beira o inacreditável. O anúncio da candidatura de Flávio Bolsonaro foi um lance de mestre inesperado que reconfigurou o tabuleiro. Imediatamente, o mercado financeiro — sempre o primeiro a reagir de forma exagerada — teve um notável "ataque de pelanca", enquanto a mídia, já confusa com os rumos da política, parecia mais perdida que azeitona em boca de banguelo. O caos se instalou.
O contexto da jogada: Por que Flávio?
Para entender o verdadeiro significado da escolha de Flávio, é fundamental enxergar além da corrida eleitoral. As negociações para cargos importantes e alianças começam muito antes do registro oficial das candidaturas. A tradição é que todo partido lance seu nome à presidência para sentar à mesa de negociações em posição de força. Partidos que não o fazem são enfraquecidos, obrigados a aderir ao projeto dos outros. Lançar um candidato é uma estratégia de negociação, não apenas uma promessa final.
O candidato natural do Partido Liberal (PL) é Jair Bolsonaro. No entanto, o "sistema" agiu para calá-lo. Após colocá-lo em prisão domiciliar e proibi-lo de usar redes sociais, o objetivo era claro: impedir suas articulações políticas. Mesmo que não concorresse, Bolsonaro precisava ser silenciado para não conseguir escolher aliados ou articular a direita em torno de um projeto forte no Congresso.
Com Bolsonaro impedido de se comunicar, a direita ficou sem uma voz clara. Aliados saíam da prisão domiciliar e cada um dava sua própria versão do que o ex-presidente pensava, gerando dúvidas e desorganização. Essa bagunça se tornou um obstáculo, inclusive, para negociações cruciais como a da anistia.
A escolha de Flávio Bolsonaro, então, tem um significado que vai muito além de uma simples candidatura.
O senador como interlocutor-chefe
Jair Bolsonaro fez mais do que escolher um candidato; ele designou seu porta-voz oficial.
Flávio Bolsonaro é conhecido no meio político como o membro mais experiente e articulado da família, depois do pai. É alguém de extrema confiança, treinado como negociador e reconhecido por ser cuidadoso com suas palavras. O fato de ser senador também pesa, visto o caos atual na Casa.
A indicação de Flávio resolve a desorganização e a dúvida na direita:
- Quem negocia por Bolsonaro? Flávio Bolsonaro.
- Quem fala por Bolsonaro? Flávio Bolsonaro.
- Quem lidera as negociações da direita a partir de agora? Flávio Bolsonaro.
A bagunça de "mil vozes" falando em nome do ex-presidente está sanada. O recado é: a partir de agora, as negociações da direita — com o Centrão, com outros partidos, e sobre pautas como a anistia — passam obrigatoriamente por ele.
Muitos perguntam: por que não Tarcísio, Michelle ou Eduardo? Tarcísio é de outro partido e governador, e já deixou claro que não pretende participar da corrida presidencial. Michelle, embora extremamente popular e carismática, tem um perfil menos voltado para a dura negociação política exigida pelo momento, o que torna a experiência do Flávio mais valiosa. O PL, por meio de Valdemar Costa Neto, confirmou: se Bolsonaro decidiu, Flávio fala pelo pai.
Bolsonaro, de dentro da prisão, resolveu a questão de liderança para que a direita possa, agora, se organizar, avançar com suas pautas no Legislativo e, principalmente, manter a estratégia de eleger o maior número de deputados e senadores, garantindo a força para a presidência.
O choque no sistema e a chantagem revertida
A notícia da candidatura de Flávio Bolsonaro gerou um desespero imediato no Centrão e em setores da esquerda, e eles tinham motivos de sobra para tal. A escolha de Flávio desnudou a estratégia que o sistema se recusava a enxergar: a direita não cederia seus votos gratuitamente, nem aceitaria um nome imposto de fora.
O primeiro movimento de Flávio, como negociador-chefe, confirmou a intenção. Ele declarou: "Tomada de decisão ontem, hoje começam as negociações. E o primeiro gesto que peço a todas as lideranças políticas que se dizem anti-Lula é aprovar a anistia ainda esse ano." O preço do acordo foi publicamente exposto, e o ex-presidente, que era chantageado, inverteu a situação, tornando-se o agente da chantagem.
O Centrão tinha a certeza de que, com Bolsonaro fora do jogo, herdaria os votos bolsonaristas de graça para lançar Tarcísio. Este era o nome ideal para agradar a elite, visto como "moderado, menos explosivo e mais aberto ao diálogo" – ou seja, menos problemático para o Supremo Tribunal Federal.
Contudo, o Centrão e o mercado se sentiram traídos. O governo atual, que chegou ao poder sob a bandeira da "frente ampla", implodiu essa aliança ao começar a nomear radicais de esquerda. Economia em frangalhos: enquanto a gestão anterior entregou uma dívida pública em queda, o governo vigente, que derrubou o teto de gastos e implementou um arcabouço fiscal insustentável, prometia entregar o `País com uma dívida em crescimento e sem dinheiro, algo reconhecido até por uma ministra.
O mercado financeiro, que vinha contando com a solução "Tarcísio", entrou em pânico. O Ibovespa despencou 4%, e o dólar e os juros futuros dispararam. Esta reação não era contra Flávio, mas sim o temor de uma reeleição do atual presidente caso a oposição não se unisse.
É fundamental deixar claro que Tarcísio é um político honrado e conta com o apoio recíproco do ex-presidente. Mas ele também é, inegavelmente, o nome que satisfaz as esferas mais altas do poder. Ele é visto como moderado, menos "explosivo" e propenso ao "diálogo com o contraditório".
O governador de São Paulo sempre foi claro: ele só aceitaria a candidatura presidencial se esse fosse o desejo de Jair Bolsonaro. Com a escolha de Flávio, este cenário mudou. Flávio afirmou que conversou com Tarcísio, que o considera uma peça-chave no projeto da direita, e, em resposta, Tarcísio demonstrou apoio total a Flávio e respeito à decisão final de Jair Bolsonaro.
O fantasma da corrupção e o papel do "isentão"
O medo da reeleição se agrava com a explosão iminente de escândalos de corrupção. O caso do roubo de aposentados do INSS promete ser a "ecatombe" de 2026. Em uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPMI), o relator denunciou que a base do governo impediu a quebra de sigilo de um voo que provaria a ligação direta do filho do presidente ("Lulinha") com o empresário do esquema. Eles dizem que "não há provas", enquanto ativamente as escondem.
Enquanto a direita se reorganiza, a mídia tradicional, que deu poder irrestrito ao Supremo para perseguir o ex-presidente, agora se choca porque a Corte se recusa a "voltar para a caixinha".
E chegamos aos antagonistas que podem estragar tudo: os "isentões". O pessoal que, em 2022, preferiu o voto nulo e ajudou a trazer o governo atual de volta. Agora, esses mesmos grupos já acenam que, se o segundo turno de 2026 for entre Flávio Bolsonaro e o atual presidente, votarão nulo novamente.
Isso é um erro colossal. O voto nulo, neste contexto, não é um protesto; é um presente direto para a reeleição do governo. Flávio Bolsonaro, que já apresentou rejeição menor do que o atual presidente em pesquisas, propõe-se a ser um nome mais "centrado". A responsabilidade de evitar o erro de 2022 recai sobre cada eleitor. Se você está em pânico com a reeleição, a solução é simples: é só não votar no candidato que você teme.
A direita amadureceu, se uniu e mostrou que tem poder de negociação. A nova aliança contra o atual governo está se desenhando. Resta saber se o "isentão" vai parar de bancar o adolescente pirracento e entender que a omissão, neste momento, é a garantia da repetição do erro. Os votos não serão mais gratuitos para quem se julgar dono do poder. A hora é de união e estratégia. (Paula Sousa é historiadora, professora e articulista; 8/12/2025)

