16/12/2025

Quinto La Niña em seis anos deve afetar safras e abastecimento

Quinto La Niña em seis anos deve afetar safras e abastecimento

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  • Nos últimos anos, as perdas globais causadas pelo fenômeno climático variaram de US$ 258 bi a US$ 329 bi
  • No Brasil, seca pode afetar plantio de soja, especialmente na região Sul

 

Inundações fatais na Ásia e tempestades de neve precoces nos Estados Unidos sinalizam o retorno do fenômeno climático La Niña, um resfriamento das águas do Pacífico que pode desestabilizar economias e desencadear desastres em todo o mundo.

 

Nos últimos anos de La Niña, as perdas globais variaram de US$ 258 bilhões a US$ 329 bilhões, de acordo com a Aon, corretora de resseguros e empresa de análise de dados. Apesar das oscilações anuais nos totais de danos, a trajetória geral é inegável: o clima extremo está elevando as perdas.

 

O La Niña é frequentemente associada a secas na Califórnia, na Argentina e no Brasil, e às inundações devastadoras que atingiram recentemente o Sudeste Asiático. Esses tipos de catástrofes se tornaram um fator cada vez mais importante na definição de termos para seguradoras, agricultores e fornecedores de energia.

 

O La Niña pode intensificar tanto secas quanto chuvas torrenciais, alimentar tempestades mais ativas no Pacífico tropical e fortalecer furacões no Atlântico. Em episódios anteriores, o padrão pode ter ajudado a impulsionar os incêndios em Los Angeles, em janeiro, e o furacão Helene, que matou mais de 250 pessoas no sul dos EUA em 2024. Nem todo evento extremo pode ser diretamente atribuído ao La Niña, mas os cientistas afirmam que as marcas são conhecidas.

 

"La Niña é como um guarda de trânsito no meio do horário de pico, auxiliando o fluxo de carros ou sistemas climáticos em certas direções preferenciais", disse Michelle L’Heureux, meteorologista do Centro de Previsão Climática dos EUA.

 

Ela também a comparou ao "maestro de uma sinfonia do clima" ou a um quarterback de futebol americano chamando as jogadas.

Embora a La Niña tenda a seguir um padrão geral, L’Heureux ressalta que cada evento é diferente e outros fatores podem influenciar o resultado final. O La Niña normalmente não tem grande influência no clima da Europa, disse L’Heureux.

 

O atual La Niña é o quinto em seis anos, parte de uma inclinação mais ampla de maior ocorrência de La Niñas do que de El Niños (aquecimento das águas do Pacífico) ao longo do último quarto de século. Os cientistas ainda estão estudando a mudança. Alguns sugerem que as mudanças climáticas podem estar influenciando o ciclo, enquanto outros as atribuem à variabilidade natural, segundo L’Heureux.

 

Os efeitos em cadeia podem atingir até mesmo os mercados globais. O La Niña é frequentemente associado a menores produtividades de milho, arroz e trigo, de acordo com uma pesquisa publicada na revista Environmental Development.

 

A demanda por energia geralmente aumenta à medida que as temperaturas mais frias se instalam no norte dos EUA, China e Japão, elevando o consumo de combustível e sobrecarregando as concessionárias de energia. Esses resultados podem, simultaneamente, aumentar os preços de algumas commodities, enquanto pressionam os de outras para baixo.

Impacto na Ásia

 

Mesmo um La Niña fraco pode deixar marcas profundas. O padrão climático provavelmente fez parte da combinação que levou a uma sequência de ciclones tropicais e inundações devastadoras que mataram mais de 1.600 pessoas e causaram prejuízos de pelo menos US$ 20 bilhões no sul e sudeste da Ásia, segundo uma equipe de pesquisadores que investigou a tempestade como parte de uma análise da World Weather Attribution.

 

As inundações que atingiram o Vietnã e a Tailândia em novembro e dezembro mataram pelo menos 500 pessoas e causaram mais de US$ 16 bilhões em danos e prejuízos, de acordo com dados compilados pela Bloomberg. Embora o papel da La Niña nestes desastres não seja certo, o padrão é consistente com seu comportamento anterior, afirmou L’Heureux.

 

"A contribuição da La Niña para as chuvas acima da média no Sudeste Asiático está custando vidas e danificando infraestrutura", afirmou Bill Hare, CEO da Climate Analytics.

 

Perspectiva para os EUA

 

Na América do Norte, o La Niña normalmente produz condições mais frias e mais neve no oeste do Canadá, no noroeste do Pacífico, no norte das Montanhas Rochosas e na região dos Grandes Lagos, disse Abby Frazier, professora de geografia da Universidade Clark.

 

Chicago já registrou, neste ano, o dia de novembro com mais neve de sua história, e o centro e o norte da Nova Inglaterra viram mais de 18 centímetros de neve em grandes áreas, com alguns locais chegando a quase 30 centímetros, de acordo com o Serviço Nacional de Meteorologia.

 

Riscos globais

 

O Brasil, maior exportador mundial de soja, está atento a sinais de que o La Niña possa reduzir as chuvas em partes das regiões produtoras do sul. A previsão indica chuvas irregulares no centro e sul do país, afirmou o meteorologista Marco Antonio dos Santos. Ele acrescentou que as preocupações estão menores por enquanto, pois não há sinais de períodos prolongados de seca com duração superior a 20 dias.

 

No Rio Grande do Sul, o plantio de soja está ligeiramente atrasado, mas progredindo, afirmou o agrônomo Alencar Paulo Rugeri. "A preocupação é que possamos ter um dezembro mais seco, mas tudo dependerá da intensidade" da seca, acrescentou.

 

As condições climáticas em todo o chamado Continente Marítimo devem ficar mais secas em dezembro, enquanto as chuvas continuam no Vietnã, de acordo com as previsões da empresa de meteorologia comercial Ignitia.

 

Chuvas irregulares podem beneficiar alguns campos agrícolas e prejudicar outros, mas o risco surge quando as chuvas chegam fora de época ou não ocorrem em períodos cruciais de crescimento, "transformando uma atividade profissional em um jogo de loteria com chances ruins", afirmou Andreas Vallgren, diretor científico da Ignitia (Bloomberg, 15/12/25)