SBT: Entre o beija-mão e o pedido de desculpas – Por Paula Sousa
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Parece que o manual de gestão de crise da TV brasileira ganhou um capítulo inédito esta semana: "Como não implodir sua audiência em 48 horas". O SBT, aquela emissora que a gente guarda no peito junto com a memória do Chaves, Chapolin, cinema em casa e do “macarrão assistindo o patrão” de domingo, resolveu testar o coração do seu público. E o teste, meus amigos, quase resultou em um óbito institucional.
Tudo começou com uma festa de gala para inaugurar o tal do SBT News. No palco, um elenco que faria qualquer espectador fiel da casa derrubar o controle remoto: de um lado, o atual presidente; do outro, o ministro Alexandre de Moraes discursando sobre liberdade de imprensa. É quase poético, se não fosse trágico. Ver quem detém o recorde de canetas nervosas contra perfis e jornalistas falando sobre "liberdade" é como ouvir um sermão sobre dieta dado por um obeso.
O resultado? O público, que não é bobo e não vive de brisa, aplicou um "cancelamento" em tempo real. Seguidores evaporaram, a credibilidade foi pro ralo e o sentimento de traição tomou conta. Afinal, o SBT foi fundado por um judeu icônico e agora dava palanque para quem relativiza barbáries contra judeus pelo mundo. A conta não fechou.
O mutirão do arrependimento
Sentindo o cheiro de queimado no faturamento, a cúpula da emissora entrou em modo desespero. A estratégia? Uma operação de guerra. Na segunda-feira, a emissora tentou provar que ainda é "do bem".
De um lado, mandaram o senador Flávio Bolsonaro para o palco do Ratinho — um território onde se resolve desde teste de DNA até o destino da nação. Do outro, no canal de notícias recém criado, escalaram Nikolas Ferreira para uma entrevista "sem anestesia". Foi o equivalente televisivo a dizer: "Olha, gente, a gente ainda gosta da direita, viu? Por favor, parem de nos xingar!"
A aula de etiqueta (e realidade) de Nikolas
Nikolas Ferreira chegou ao SBT News com aquele sorriso de quem sabe que tem a faca e o queijo na mão. Com muita educação e ironia, ele não apenas respondeu perguntas; ele deu uma consultoria gratuita de identidade.
Sem precisar gritar, ele tocou na ferida exposta: Como uma emissora com a história do SBT permite que um ministro, que não é jornalista nem político eleito, use seu microfone para se autopromover? O silêncio do apresentador durante a fala de Nikolas foi tão profundo que deu para ouvir o desespero nos bastidores. Ele lembrou que o SBT não é só uma concessão pública, é afeto. E que esse afeto foi ferido quando a inauguração do portal pareceu mais uma "festa entre amigos" do sistema do que um evento jornalístico.
Ele ainda lembrou das origens do fundador do SBT: A emissora fundada por um judeu recebe um 'presidente' que claramente apoia o lado que quer exterminar os judeus da face da Terra. O que as herdeiras de Senor Abravanel estavam pensando?
Flávio Bolsonaro no Ratinho
Enquanto isso, no entretenimento, Flávio Bolsonaro operava um pequeno milagre de comunicação. Se a esquerda achou que, ao tirar o "Bolsonaro Pai" do jogo, resolveria o problema, eles acabaram de criar um novo pesadelo: um Bolsonaro que articula, não grita e fala diretamente com a dona de casa.
No Ratinho, Flávio não caiu em armadilhas. Quando questionado sobre a polarização, ele deu um xeque-mate simples: "Eu posso ter lado, a plateia pode ter lado. Quem não pode ter lado é juiz". É uma frase tão óbvia que chega a ser revolucionária no Brasil atual.
Ele falou de segurança pública com a firmeza que o eleitor médio exige e explicou economia (como o Bolsa Família) sem o economês chato que faz a gente trocar de canal. A reação da plateia feminina foi o termômetro: o encanto foi visível. Flávio conseguiu a proeza de manter os votos do pai e, possivelmente, começar a curar a “rejeição” que o sobrenome carrega, apresentando uma versão "estadista" e centrada da família.
O saldo do desespero
O SBT tentou apagar o incêndio, mas acabou levando uma aula pública sobre o que o seu próprio público espera dele. A tentativa de parecer "isenta" contratando militantes com crachá de jornalista não engana mais ninguém. A neutralidade na TV hoje em dia é como unicórnio: todo mundo fala, mas ninguém viu.
No fim das contas, foi um episódio divertido de assistir. Ver o sistema tentando recalcular a rota enquanto dois políticos da nova geração escancaram as contradições da emissora, ao vivo, é o tipo de entretenimento que nem o Silvio Santos, no seu auge, conseguiria roteirizar.
O recado foi dado: não adianta tentar sinalizar virtude para o regime e depois pedir desculpas para o povo. O público pode até perdoar, mas o controle remoto está sempre à mão. (Paula Sousa é historiadora, professora e articulista; 17/12/2025)

